segunda-feira, 24 de outubro de 2011

O MONSTRO

         O Excelentíssimo Senhor Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva, actual Presidente da República Portuguesa, parece não se recordar que, enquanto Primeiro-Ministro de Portugal, corriam os anos de 1988/1989, teve por bem submeter a Função Pública a dois regimes que se mantinham há largos anos inalterados.

         1 - A Função Pública, como todos sabemos, não pagava impostos sobre o rendimento, isto é, os seus salários eram mais baixos do que no sector privado porque não estavam sujeitos, à época, ao Imposto Profissional e ao Imposto Complementar. Todos os outros impostos eram pagos como os demais cidadãos.

         Porém o senhor Professor, aquando da entrada em vigor do novo regime de tributação em 01/09/1989, lembrou-se de tributar, em sede do imposto sobre o rendimento (IRS), os salários da Função Pública e para isso teve que aumentar os salários na justa medida do imposto que iriam passar a pagar.

         Exemplificando: um funcionário que, à época, ganhasse 20.000$00 (vinte mil escudos) mensais passou a ganhar, porque sujeito a imposto, 25.000$00 (vinte e cinco mil escudos). Porém, como no IRS há um conjunto de deduções fiscais, que aplicados, o imposto final a pagar não seriam os 5.000$00 mensais, mas uma quantia muito menor. Isto é, o aumento do salário por força do pagamento do imposto não gerou receita igual à despesa. Seria de esperar que o que foi gasto a mais em salários teria retorno igual a título de imposto. Mas isso nunca se poderia verificar, como se sabe.

         Ora, como os salários dos funcionários públicos entram para o cálculo das contas nacionais (Produto Interno Bruto), nesse ano verificou-se um aumento enorme no PIB por força dos aumentos artificiais na função pública, cujos salários passaram a pagar imposto sobre o rendimento.

         Agora, com o não pagamento dos subsídios (de férias e de Natal), em 2012 e 2013, haverá uma redução da despesa do Estado, que forçará a correlativa diminuição do PIB.

         Como o Estado (o Estado somos todos nós) tem de baixar a despesa, qual a melhor solução? Fazer o inverso que o Senhor Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva fez. Baixar a despesa nacional com a Função Pública. Como? Isentando-a novamente de impostos sobre o rendimento (IRS), baixando-lhe o salário e pensões em conformidade com as tabelas do IRS. Claro que o PIB baixará, como baixará a cobrança de impostos em sede de IRS. Estou convicto que a baixa da despesa será maior que a baixa da receita, tal como aconteceu no passado em sentido inverso, quando a Função Pública passou a pagar impostos.

         Por isso, o Senhor Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva não tem razão quando critica o Governo pelo orçamento de 2012. Não tem razão porque foi sua Excelência, enquanto Primeiro-Ministro, quem criou o “Monstro”: aumentou, e muito, a despesa pública pondo a Função Pública a pagar imposto sobre o rendimento, e não tem razão porque a baixa da despesa pública, em 2012 (com o não pagamento dos subsídios) será muito superior ao IRS que seria cobrado, em 2013, se tais pagamentos fossem feitos.

         2 - O outro regime em vigor, e bem, desde há muito, era o sistema remuneratório dos Funcionários Públicos. Todos os funcionários estavam incluídos na tabela remuneratória, de “A” a “Z”, e todos, com as mesmas funções, independentemente do Ministério onde estivessem colocados, recebiam o mesmo salário, segundo a directiva constitucional de “a trabalho igual salário igual”.

Ora, o Senhor Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva achou por bem alterar o status quo. Criou novas tabelas de harmonia com os Ministérios ou serviços, todas diferentes umas das outras, ficou sem se saber, com facilidade, quanto cada um ganha, e o conceito de “a trabalho igual salário igual”, na Função Pública, foi por água abaixo. E como se isso ainda não bastasse, foi criado um sistema de aumentos horizontais (as diuturnidades) de modo quanto mais antigo na categoria estivesse um funcionário mais ganharia, diminuindo a vontade de progredir na carreira, pois, em determinados casos, a promoção poderia, eventualmente, corresponder a uma diminuição salarial, em especial, para quem estivesse perto da idade da reforma.

Para acabar com o “monstro” criado pelo Senhor Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva seria necessário voltar-se ao sistema anterior: os funcionários públicos voltariam a não pagar impostos sobre os salários auferidos ao serviço do Estado e a criação de uma tabela salarial, uniforme para toda a Função Pública, cumprindo o ditame constitucional de “a trabalho igual salário igual”.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

JUNTAS DE FREGUESIA

         Em Portugal, a mais pequena divisão administrativa é a Freguesia.


Em princípio  [embora haja, pelo menos, um município sem freguesia (Corvo, nos Açores), e vários com uma única freguesia],  várias juntas de freguesia constituirão um Concelho, cujas raízes remontam aos primórdios da nossa nacionalidade.


Historicamente, a freguesia e paróquia eram uma só e a mesma coisa.


É, em Julho de 1835, que surge, pela primeira vez, a separação civil da divisão eclesiástica, sendo, todavia coincidentes as áreas geográficas. Por essa altura, o termo «freguês» (fillius eclesiae, filho da igreja) servia para designar os paroquianos, que eram, por assim dizer, «fregueses» do pároco.


Com o advento da República, após a Lei n.º 621, de 23 de Junho de 1916, as paróquias civis passam a designar-se freguesias (a Junta de Paróquia passa a designar-se Junta de Freguesia), fixando-se, assim, a diferença entre a estrutura civil (freguesia) e a estrutura eclesiástica (paróquia).


Existem, em Portugal, “apenas”, 4.260 freguesias, com territórios que podem ultrapassar os 100 km² ou ser de apenas alguns hectares, e populações que vão das dezenas às dezenas de milhares de habitantes.


         E, todos nós sabemos das dificuldades que Portugal atravessa, fruto de, durante vários anos, andar a gastar-se mais do que aquilo que se deveria, até que chegou-se ao limite, e precisou-se de pedir vultuosos empréstimos para poder pagar os salários e as reformas dos servidores públicos, o último dos quais foi de 78.000.000.000 euros.


         Aqui não interessará, debater-se a problemática financeira da Nação, mas tão-só a decisão, em conformidade com o que nos foi imposto pelos credores, de eliminar umas tantas Juntas de Freguesia e uns tantos Concelhos.


         E, para concretizar essa diminuição de freguesias, foi elaborado um plano, segundo o qual as freguesias a “eliminar” serão agregadas a outras, isto é, as suas fronteiras físicas manter-se-ão, sendo que os órgãos executivo e deliberativo é que serão politicamente diferentes, abarcando uma ou mais freguesias.


         Não haverá, portanto, eliminação das freguesias enquanto tais. Os territórios actualmente divididos administrativamente permanecerão.


         Ora, no concelho de Matosinhos, está previsto que duas freguesias serão “agregadas”, e logo um coro de protestos, falseando a verdade, vem dizendo que as freguesias serão eliminadas pura e simplesmente. Nada de mais errado. Só os menos atentos às notícias que vieram a lume é que poderão defender tal tese.


         Mas é curiosa a evolução desta luta contra a “eliminação física” das freguesias de Guifões e de Leça da Palmeira (por ordem alfabética, pois claro!).


Segundo o jornal “Público”, de 13 de Outubro de 2011, em 29 de Setembro de 2011, a Assembleia Municipal de Matosinhos debateu este problema sob proposta do Bloco de Esquerda e da CDU, tendo sido, curiosamente, a mesma “chumbada” com os votos contra dos Presidentes de Junta das Freguesias de Guifões e de Leça da Palmeira, que são, convém lembrar, “deputados municipais” por inerência de funções.


Porém, agora, os mesmos Presidentes de Junta que, em 29 de Setembro de 2011, votaram contra a proposta – repúdio contra a extinção –, desdobram-se, agora, em actividades contra a “extinção” das respectivas juntas de freguesia.


É curioso, não é?