As Câmaras Municipais de Setúbal e Vila Nova de Gaia, entre outras, provavelmente, tiveram por bem lançar mão de mais uma taxa municipal.
Desta feita, com a desculpa do ressarcimento dos encargos que têm com o Batalhão de Sapadores Bombeiros e, para isso, nada melhor que lançar mão de uma taxa, ao abrigo do nº 2 do artigo 5º da Lei nº 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que prevê a criação de taxas para o “financiamento de utilidades geradas pela realização de despesa pública local, quando desta resultem utilidades divisíveis que beneficiem um grupo certo e determinado de sujeitos, independentemente da sua vontade”.
Nos termos da alínea f) do nº 1 do artigo 6º do mesmo diploma, as taxas incidirão sobre utilidades prestadas aos particulares ou geradas pelas actividades dos municípios.
Ora, defendem as autarquias que as supracitadas taxas são devidas pelos princípios da prevenção e da precaução, segundo o qual os riscos devem ser antecipados de forma a eliminar as suas causas ou reduzir as suas consequências, e pelo princípio da cooperação que assenta no reconhecimento de que a protecção civil constitui atribuição do Estado, no seu sentido mais lato.
E acrescentam que os cidadãos têm o direito de ter à sua disposição informações concretas sobre os riscos colectivos e como os prevenir e minimizar os seus efeitos, caso os mesmos ocorram. Têm o direito de ser prontamente socorridos sempre que aconteça um acidente ou catástrofe. E, a esse direito correspondente o correlativo dever de comparticipação na despesa gerada com a protecção civil na área do seu município de modo a tornar a protecção civil sustentável do ponto de vista financeiro.
E, agora, os munícipes pagarão uma nova taxa, por sinal de montantes bem diversos, porque nisto de taxas municipais vale a imaginação de cada um.
Em Setúbal, e em função do potencial risco,
- Os prédios devolutos pagarão sempre 5,10 euros mensais;
- O comércio e serviços pagarão, mensalmente, entre 6,45 e 886,85 euros;
- A indústria pagará, mensalmente, entre 236,25 e os 3.543,40 euros.
Em Vila Nova de Gaia:
- Os prédios rústicos e urbanos pagarão, por cada 100.000 euros de valor patrimonial, uma taxa mensal de 10 euros;
- As redes rodoviárias, por cada duas faixas de rodagem e por metro linear e por ano, 0,41 euros; (1)
- As redes ferroviárias, por metro linear e por ano, 2,03 euros;
- As redes de telecomunicações, por metro linear e por ano, 0,02 euros;
- As redes de gás e de electricidade, por metro linear e por ano, 0,03 euros.
E, aqui surgem as perguntas.
Para que se pagam tantos impostos?
Para que servem, afinal, as Câmaras Municipais se tudo é pago por fora, ao abrigo de taxas de duvidosa constitucionalidade?
Paga-se a recolha do lixo no consumo de água;
Paga-se a utilização do saneamento no consumo de água;
Paga-se o estacionamento nos parcómetros;
Paga-se a via pública e o saneamento quando se compra um prédio ou uma sua fracção autónoma;
Paga-se a iluminação pública na mesma altura;
Pagam-se as portagens para transitar entre locais do mesmo conselho;
Paga-se o imposto municipal sobre imóveis;
Paga-se a derrama sobre os lucros das empresas;
Parte do IVA e do IRS é para os municípios.
Para quê, afinal tanto imposto, se, agora, também se tem de pagar a existência dos bombeiros?
***
O Legislador de Setúbal faz, no regulamento, confusão de conceitos que poderão, no futuro, trazer problemas de interpretação das normas.
O artigo 3º contém as normas de incidência da taxa municipal.
E o artigo 4º reproduz as isenções. Porém, na alínea b) do seu nº 1 diz que estão isentos do pagamento “todas as situações de não incidência previstas no artigo 3º.” (SIC).
Ora, se determinada situação de facto não está sujeita a um imposto ou taxa dele(a) não poderá estar isento(a), já que, por definição de conceitos, para se estar isento tem que se estar sujeito.
Se assim não for, estar-se-á perante uma situação de não sujeição e não de isenção, como é o caso do regulamento municipal.
_______________________
(1) Nota: O legislador, a meu ver, faz confusão entre faixas de rodagem e vias de circulação: todas as estradas, excepto as de sentido único, têm uma faixa de rodagem com duas vias; se as duas faixas de rodagem (uma em cada sentido), estiveram separadas fisicamente, teremos, duas faixas de rodagem; em cada uma das faixas de rodagem podem existir uma ou mais vias de circulação. O que o legislador quererá tributar são as auto-estradas que têm duas ou mais vias em cada uma das faixas de rodagem! Por definição de conceitos, uma autoestrada, ou via equiparada, tem obrigatoriamente, uma faixa de rodagem em cada um dos sentidos com, pelo menos, duas vias de circulação em cada uma delas.
Sem comentários:
Enviar um comentário