sexta-feira, 14 de março de 2014

A DESCENTRALIZAÇÃO E A DESCONCENTRAÇÃO ADMINISTRATIVAS

Há pessoas com responsabilidades na gestão da coisa pública que confunde, no seu dia-a-dia, os conceitos de descentralização e desconcentração administrativas.
Um Governo, seja ele qual for, para poder governar tem de descentralizar o poder decisório e de desconcentrar os serviços sob pena de tornar ingovernável o território.
Foi sempre assim, desde que há memória, pois o Governo Central não pode decidir tudo.
Na antiguidade, numa era em que as comunicações eram lentas, os Assírios dividiam o seu enorme território em províncias (satrapias) sendo que os governadores (os sátrapas) agiam com poderes delegados, em nome do Xá.
O sátrapa era o chefe da administração da sua província, cobrava os impostos, era o juiz, o chefe da polícia e o chefe das forças armadas provinciais. E, periódica e pessoalmente, prestava contas ao Xá.
E além de agir com poderes delegados pelo Xá, desconcentravam os serviços. As repartições públicas da época eram distribuídas pelo território (os serviços de finanças, as esquadras de polícia, os quartéis, as alfândegas) tal como nos dias de hoje.
Após as suas conquistas, Alexandre, O Grande, manteve essa organização territorial porque viu nela o melhor meio de atingir os seus fins: uma boa governação dos povos conquistados.
E foi sempre assim, ao longo dos séculos, mesmo entre nós, desde os “ouvidores do Reino” aos “Vice-Reis das Índias” passando pelos “juízes de fora”.
Hoje, face à enorme complexidade da governação, o poder é descentralizado no sentido em que a tomada de decisões é partilhada por um ou mais órgãos na cadeia hierárquica.
E assim surgiram, em alguns países, as Regiões Administrativas que se foram subdividindo em territórios cada vez mais pequenos (os municípios) e estes em outros ainda mais pequenos (as freguesias) como é, aliás, exemplo único a República Portuguesa.
Mesmo dentro do respectivo município, o senhor Presidente da Câmara Municipal pode delegar alguns dos seus poderes nos seus vereadores ou noutros funcionários camarários, ou nos Presidentes de Junta de Freguesia, podendo, sempre, em qualquer altura, chamar a si o processo para decisão (avocação).
Noutras situações, em que os serviços estão espalhados um pouco por todo o território, em que o poder decisório último é do órgão máximo, estamos perante uma desconcentração de serviços. É o caso paradigmático dos Serviços de Finanças que tão bem se conhece: o poder decisório não está no chefe dos serviços locais, que pode agir, em alguns casos concretos, com poderes em si delegados pelo seu superior hierárquico, mas no topo da hierarquia, de harmonia com a complexidade dos casos, que é ou o Director-Geral da Autoridade Tributária ou o Ministro das Finanças ou o próprio Primeiro-Ministro.
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Com os actuais meios de comunicação, com a rapidez com que todos estão em contacto com todos, esta divisão territorial já não faz sentido. De facto, não estamos numa época da lentidão exasperante dos meios de comunicação. O longe se fez perto. As condições não são as mesmas que há duzentos e muitos anos. Mas alguns teimam em manter essa divisão territorial.

In Jornal de Matosinhos nº 1734, de 14 de Março de 2014


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