quinta-feira, 24 de abril de 2014

OS CUSTOS DA DEMOCRACIA

A democracia é um sistema de governo no qual os cidadãos têm a capacidade e o direito de influenciar as políticas públicas no seu país, através da participação activa em eleições periódicas, com voto secreto, nos referendos sobre questões de primordial importância para a vida em sociedade, participando em discussões públicas, na Comunicação Social, e/ou em fóruns.
A Democracia, para além de ser um sistema de Governo, é uma forma de vida, no sentido de que quem nela acredita vai trabalhar no sentido de criar um Novo Mundo e que cada escolha individual vai afectar a sociedade em que está inserido e vai contribuir para a realização dos valores de uma sociedade verdadeiramente democrática, como, por exemplo, os direitos à liberdade individual, à liberdade de expressão, à liberdade de associação, aos direitos de propriedade, à liberdade de movimentos (liberdade de circulação de pessoas e bens), com o respeito total da vida humana, com a abolição da pena de morte e dos tratamentos cruéis e desumanos aos que estão, por razões várias, privados provisoriamente da sua liberdade.
Um dos princípios fundamentais de uma democracia é a regra da maioria expressa em eleições livres em que a cada eleitor corresponde um voto, e, como em democracia, a unanimidade nunca é possível, há que respeitar as minorias, evitando-se, deste modo, a anarquia. Outro princípio é o Estado de Direito com a prevalecente igualdade perante a Lei e o respeito pelas leis vigentes.
Há três tipos de democracias:
1 – A Democracia directa – típica da Antiguidade Clássica, porque não havendo muitos eleitores (o direito de voto era cingido apenas a uma parte da população), estes reuniam-se em conclave discutindo e votando livremente. Só pode existir em territórios com muito pouca população;
2 – A Democracia representativa – típica dos nossos tempos, em que o Governo está dividido tripartidamente: o Legislativo, o Executivo e o Judicial. Os eleitores, aos milhões, escolhem livremente os seus representantes nas assembleias legislativas (parlamentos). É o Governo do Povo, para o Povo e pelo Povo;
3 – A Democracia popular, típica das ditaduras dos países ditos socialistas, de que é exemplo a República Democrática Popular da Coreia do Norte.
Foi sempre assim?
Não, como todos sabemos. Nas nossas vidas, já assistimos a ditaduras mais ou menos encapotadas – as democracias musculadas, as democracias de partido único – e às ditaduras mais férreas onde o conceito de liberdade era(é) pura e simplesmente ignorado.
A Democracia tem custos financeiros?
Obviamente que os tem. Para que exista uma verdadeira igualdade de oportunidades nas eleições, os partidos têm de ser financiados pelo Estado, para afastar o risco de os candidatos abastados serem favorecidos nas eleições: é a razão fundamental para as limitações ao financiamento dos partidos
Mas há quem, não obstante vivermos numa democracia, se opõe a ela de uma maneira insidiosa: com a desculpa de que vivemos em crise, critica a comparticipação estatal aos partidos políticos, como se pudesse existir democracia sem partidos políticos organizados e com comparticipação exclusivamente privada.
Se os partidos não tivessem os subsídios estatais, se não houvesse limitação às contribuições individuais e das empresas, os partidos ficariam sujeitos às nefastas influências dos candidatos mais ricos ou fortemente subsidiados por organizações privadas, independentemente do seu objecto social. Estariam em vantagem sobre os demais candidatos, com a consequente subversão da democracia.
Será isso que alguns pretendem?


In Jornal de Matosinhos nº 1740, de 25 de Abril de 2014

quinta-feira, 17 de abril de 2014

IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS - IMI

         Nos tempos anteriores ao “25 de Abril de 1974”, a grande maioria da população portuguesa procurava “poupar para a velhice”, juntando verbas, fruto de um enorme sacrifício (*), para construir a sua casa onde viver e, se possível, ter uma outra para rendimento, para complemento da sua pensão, caso a tivesse.
Ao tempo, o valor do património imobiliário era calculado em função da renda potencial no mercado de arrendamento, e os valores matriciais eram relativamente baixos, pelo que quer a Contribuição Predial, primeiro, e depois, a Contribuição Autárquica não pesavam muito no bolso dos proprietários. Eram, ao tempo, impostos, digamos assim, acessíveis para a bolsa dos respectivos proprietários.
E a renda potencial variava em função do estado de conservação do imóvel e da respectiva localização, pelo que os imóveis melhor conservados e localizados teriam uma renda potencialmente superior aos demais – tudo em função de uma renda obtida no respectivo mercado.
A novíssima reforma, com o Imposto Municipal sobre os Imóveis, o IMI, veio mudar radicalmente o valor patrimonial dos imóveis, desde logo através da aplicação de uma fórmula matemática onde se consideram alguns pontos não muito consentâneos com a realidade. De facto, o factor localização já nada tem a ver com a localização em concreto, mas numa determinada zona mais ou menos ampla, normalmente limitada por artérias citadinas. Um imóvel pode estar situado numa zona de maus acessos, que mal consegue entrar no mercado de arrendamento, mas porque se localiza numa zona mais nobre, é tão valorizado como outros com uma situação verdadeiramente privilegiada: o índice de localização será o mesmo para todos eles.
Há muito pouco tempo realizou-se uma avaliação generalizada, com o fim de aproximar o valor patrimonial dos prédios ao seu valor de mercado, e, em resultado dela, muitos imóveis viram o seu valor patrimonial ficar acima do seu valor no mercado, e, como isso era previsível, foi criada uma cláusula de salvaguarda, de modo a impedir o aumento brutal do imposto de uma só vez, mas diluí-lo ao longo do tempo.
Essa cláusula de salvaguarda está a chegar ao fim, e os proprietários de menores rendimentos, nomeadamente os aposentados que viram as suas pensões diminuídas, estão em pânico: segundo alguma Comunicação Social, prevê-se este ano um aumento na cobrança do IMI em cerca de 122%(!), fruto não apenas das avaliações como do termo dos prazos das isenções fiscais.
         Porém, alguns autarcas têm vindo a queixar-se que as receitas provindas do património edificado é insuficiente porque a construção baixou drasticamente, pelo que não podem, agora, contar com as receitas das taxas construtivas nem dos impostos sobre as transmissões imobiliárias.
         Mas não se pode sobrecarregar ainda mais o património imobiliário só porque alguns autarcas, não gerindo bem os escassos recursos financeiros colocados à sua disposição, são insaciáveis no seu voraz apetite por este imposto, como se não houvesse um limite ao sacrifício generalizado imposto aos portugueses.
E os senhores autarcas esquecem-se que além do IMI, ainda recebem o IMT, uma parte do IVA e do IRS, as derramas municipais sobre o IRC, e muitos outros impostos travestidos de taxas (pela recolha do lixo, pela utilização do saneamento, pela publicidade, etc, etc.)
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(*) poupar é um sacrifício porque exige a renúncia a bens e serviços que deixam de ser satisfeitos, e pagar impostos ainda é um sacrifício muito maior porque obriga a muitas mais renúncias (ao menos se o dinheiro dos impostos fosse bem gerido…)

In Jornal de Matosinhos nº 1739, de 18/04/2014


sexta-feira, 11 de abril de 2014

ASSIM VAI O PAÍS (IV)

É habitual ouvir-se e ler-se na Comunicação Social algumas “boutades” dos nossos políticos, algumas das quais não passam de “sound bytes”: frases soltas, muitas delas sem qualquer sentido, mas que ficam nos ouvidos dos eleitores.
Desta vez, um dirigente partidário afirmou que “quem não vota é cúmplice do Governo!”, isto é, os abstencionistas são cúmplices do Governo.
Ora, é por demais sabido que a abstenção é elevada. Mas porque não votam os portugueses?
1.     Os cadernos eleitorais, como se sabe, não espelham o número real de eleitores, pelo que os que estão a mais nos cadernos eleitorais não votam – os “eleitores fantasma” são cúmplices do Governo!
2.     Eleitores há que, entre o recenseamento e a votação, morrem; não podem, portanto, votar – os mortos são cúmplices do Governo!
3.     Há eleitores que, por razões de saúde, se encontram hospitalizados ou internados noutros estabelecimentos pelo que não podendo sair, não votam – os doentes são cúmplices do Governo!
4.     Há eleitores que, por razões profissionais, se encontram deslocados, dentro ou fora do país (migraram para obterem o sustento das suas famílias) e, por estarem longe das assembleias de voto, não votam – os migrantes são cúmplices do Governo!
5.     Há um numeroso grupo de eleitores que querendo votar (e até o querem fazer) mas que disso estão impossibilitados devido à existência de barreiras arquitectónicas (*). Neste grupo, englobam-se todos aqueles que o legislador, na sua sapiência, apelida de “portadores de deficiência”. E como não podem vencer as barreiras arquitectónicas não votam – os “portadores de deficiência” também são cúmplices do Governo!
6.     Outros há que, por razões filosóficas ou religiosas, não votam. É-lhes indiferente quem quer que esteja no governo – os politicamente neutros são cúmplices do Governo!
7.     Há um grupo de eleitores que não vota porque está a executar as suas tarefas profissionais e, consequentemente, não pode votar – os que trabalham são cúmplices do Governo!
8.     Finalmente, há um grupo que não vota porque sim – não vota porque não quer, não se está para incomodar, tem mais que fazer (está na praia, por exemplo) e até porque, mais tarde, quererão dizer: “eu não votei neles”. Estão-se nas tintas para o País – os que se “estão nas tintas para o País” são os verdadeiros cúmplices do Governo!

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(*) Segundo se diz, Portugal é o País da Europa, quiçá do Mundo, que tem as melhores leis sobre a integração social das pessoas com deficiência. Será!? Mas não as aplica!! As barreiras nas vias públicas continuam, os acessos aos edifícios (existem elevadores onde não cabe uma cadeira de rodas!), aos estabelecimentos comerciais, aos escritórios, aos consultórios, muitos deles médicos, a clínicas e, pasme-se!, até aos hospitais públicos, sendo disso exemplo paradigmático o Hospital Pedro Hispano, em Matosinhos. Os seus acessos não são para doentes, mas para verdadeiros atletas!


In Jornal de Matosinhos nº 1738, de 11 de Abril de 2014

quinta-feira, 3 de abril de 2014

ASSIM VAI O PAÍS (III)

Para a felicidade de uma família ou de uma sociedade ou de um país é importante que as respectivas finanças estejam equilibradas, isto é, que as receitas sejam superiores às despesas, nem que o sejam em apenas um cêntimo.
Basta que surja um desequilíbrio nas contas – que as despesas sejam superiores às receitas – para que, de imediato, surjam os problemas, nomeadamente, as discussões entre o casal, entre os sócios da sociedade ou entre as forças políticas do país, porque há que equilibrar a balança orçamental através da contratação de empréstimos que, acrescido dos juros do capital mutuado, vai engrossar, ainda mais, as despesas, com o consequente apertar do cinto.
Daí a necessidade de um equilíbrio nas despesas: da conta bancária, seja ela qual for, não deve sair mais dinheiro do que aquele que entra.
Num condomínio é a mesma coisa.
Depois da aprovação de um orçamento previsional para um ano determinado, as quotas condominiais são cobradas com o acréscimo legal, para o Fundo de Reserva, destinado, por força da Lei, a realização de obras futuras.
Nesse condomínio, no final do ano, não obstante ter sido previsto um gasto de, digamos, 100 gastou-se, por razões de vária ordem, 136. Há um défice de 36 que urge repor, já que as dívidas a terceiros têm de ser pagas.
Mandava o bom senso que o senhor administrador propusesse à assembleia de condóminos a aprovação de um orçamento extraordinário de montante igual ao desvio orçamental, isto é de 36, com a consequente cobrança de quotas-extra para “tapar o buraco”.
Mas o senhor administrador, tal como os governantes deste país, em vez de propor aquela cobrança de quotas-extra, empurrou a dívida para o futuro. Fez uma proposta ilegal, por violação da Lei vigente. Aquele desvio orçamental será pago com as verbas existentes no Fundo de Reserva, não havendo, portanto, encargos imediatos para os senhores condóminos.
E a assembleia, por maioria dos votos dos senhores condóminos presentes, aprovou aquela proposta.
Isto é, para ficar bem na fotografia o senhor administrador empobreceu, de imediato, o condomínio de que é responsável, pela diminuição dos seus activos – o Fundo de Reserva – para pagar aos credores – poupando, destarte, aos senhores condóminos o pagamento de quotas-extra.
Mas o Fundo de Reserva, destinado a obras futuras, ficou mais pobre, sendo as gerações dos futuros condóminos que irão pagar o que, na actualidade, não foi pago.
É essa a mentalidade do português: empurra os seus problemas financeiros para o futuro, hipotecando as novas gerações que pagará as despesas por eles não feitas.

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Em alguns condomínios é habitual existirem dois Fundos de Reserva: o verdadeiro, o que existe consta do activo; o que não existe, mas que deveria existir, consta do passivo. E assim se vão enganando os condóminos menos atentos.


In Jornal de Matosinhos nº 1737, de 4 de Abril de 2014