segunda-feira, 27 de outubro de 2014

IRS - Imposto sobre os Trabalhadores?

Quando comentava a proposta do Orçamento do Estado para 2015, um deputado fez a costumeira crítica com alguma demagogia à mistura afirmando que o IRS era um imposto sobre os trabalhadores (cito de cor).
Ora, não há qualquer imposto sobre os trabalhadores enquanto tais.
Houve, num passado não muito distante, um Imposto, o Imposto Profissional, que tributava exclusivamente os rendimentos do trabalho, mas também não era um imposto sobre os trabalhadores!
A tributação sobre os rendimentos que, actualmente, existe [e em substituição dos vários impostos sectoriais a que ainda acrescia o imposto complementar] entrou em vigor, com a nova reforma fiscal dos finais dos anos 80 do século passado, um imposto único sobre os rendimentos – o IRS – que tributa os vários rendimentos sectoriais, incluindo os rendimentos provenientes do trabalho, mas não tributa os trabalhadores enquanto tais.
Então, o que tributa o IRS?
O IRS está dividido em categorias de rendimentos:
1º - os rendimentos do trabalho dependente – os rendimentos provenientes do trabalho por conta de outrém;
2º - os rendimentos empresariais e profissionais – rendimentos de empresários que não se constituíram num dos diversos tipos de sociedades e dos trabalhadores independentes (*);
3º - os rendimentos de capitais – como o seu nome indica os rendimentos de aplicações das poupanças em título de natureza mobiliária, como por exemplo, depósitos bancários (à ordem ou a prazo), acções (os dividendos) e obrigações, que são os mais comuns.;
4º - os rendimentos prediais – as rendas dos prédios urbanos (ou das suas fracções autónomas), dos prédios rústicos e dos prédios mistos;
5º - os incrementos patrimoniais – entre outros, as mais-valias na venda de património imobiliário e as indemnizações pelos danos não patrimoniais;
6º - as pensões de reforma, de velhice, de invalidez ou de sobrevivência e as de alimentos, incluindo as rendas temporárias e vitalícias.
         Pelo que se vê, o IRS não é um imposto sobre os trabalhadores.
É um imposto sobre os rendimentos auferidos pelos cidadãos, sejam ou não, trabalhadores por conta própria ou por conta de outrém, ou simplesmente não trabalhem, vivendo de rendimentos.
         Poderá discutir-se a justeza da tributação do rendimento do trabalho e das pensões/reformas, mas isso é outra coisa.

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(*) Muitos dos trabalhadores ditos “trabalhadores independentes” não são verdadeiramente independentes. A nomenclatura “trabalhadores independentes” destinava-se, originariamente, aos profissionais liberais.
Mas, em virtude de sucessivas alterações à “tabela anexa” prevista no artigo 151º do CIRS quase que todas as profissões podem ser consideradas, agora, como sendo profissões liberais [os vigilantes, os guardas, as mulheres de limpeza, os trabalhadores de escritório, de consultórios médicos, etc.].
De facto, em fraude à lei, muitos desses trabalhadores labutam num local de trabalho certo e determinado, obedecem a um horário rígido e respondem a um superior hierárquico. Não são verdadeiros trabalhadores independentes. São aquilo a que se convencionou chamar “falsos recibos verdes” e nada se tem feito para acabar com eles o que é mau para a economia nacional já que os trabalhadores precários nunca podem ter o mesmo rendimento/produção que os demais trabalhadores por conta de outrém. Para esses “trabalhadores por conta de outrém” foi criada a rubrica “15 – Outras actividades exclusivamente de prestação de serviços: 1519 – Outros prestadores de serviços”.

IN Jornal de Matosinhos nº 1766, de 24 de Outubro de 2014


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