Recordar-se-ão,
decerto, das lutas do primeiro quartel do século XIX, em Portugal, entre o
poder estabelecido – o absolutismo – e as novas ideias que se iam espalhando
pelo mundo – o liberalismo.
O termo
liberalismo, sendo polissémico, pode ser entendido em dois domínios:
1. O económico – é uma teoria económica
que aspira a reduzir o envolvimento do Estado nos processos sociais, baseado
nas reivindicações individuais com fundamento no direito natural. De acordo com
os seus defensores clássicos o homem é egoísta e é impulsionado a partir de um
desejo de promover o seu interesse individual, o que também é em benefício do
interesse da comunidade – a “mão
invisível” de Adam Smith – o homem age como que impulsionado por uma mão invisível que o força a ter um
determinado comportamento económico.
2. O político – do ponto de vista político
[do latim “liber” – homem livre – e do adjectivo “liberalis” (*)] tem como base
a liberdade humana. Para os liberais, um Estado tem de ter um Governo
Constitucional, e as mais básicas liberdades, desde logo a liberdade religiosa,
o direito de propriedade, a liberdade de expressão e a igualdade perante a lei,
em oposição aos regimes autoritários.
As suas
ideias radicam nos tempos da antiguidade Clássica (Grécia e Roma) (**), tendo
evoluído ao longo dos tempos:
» em 1215 –
com a assinatura, em Inglaterra, da “Magna
Charta Libertatum seu Concordiam inter regem Johannen at barones pro concessione
libertatum ecclesiae et regni angliae”;
» as ideias de S. Tomás de Aquino
(1225/1274), sobre os conceitos de direito natural e da guerra justa;
» as teses do historiador árabe Ibn Khaldn
(sec XIV) sobre os direitos de propriedade, os impostos baixos e as normas de
governação;
» as teses do rabino Isaac ben Yehuda Abarbanel
sobre as vantagens da República sobre a Monarquia, nomeadamente das limitações
ao poder do governo e ao modo de o controlar;
Mas foi com o
Iluminismo do século XVII, com John
Lock que avançou com o conceito dos direitos
naturais que o ser humano tem: o direito à vida, à liberdade e à
propriedade, pondo termo ao feudalismo, aos privilégios na nobreza e à
teocracia e, por fim, às monarquias absolutas, conduzindo às Revoluções Americana
(1775 a 1783) e Francesa (1789 a 1799).
O que será, então, um Estado Liberal?
»»
Desde logo, um Governo Constitucional, em que a Constituição é um conjunto de
princípios definidores dos procedimentos governamentais, “uma ferramenta não para limitar as pessoas, mas para limitar o Governo”;
»»
Separação de poderes – os vários ramos do poder estão separados, controlando-se
mutuamente – o Legislativo, o Judicial e o Executivo, e em que este
descentraliza os seus poderes em entes territorialmente menores;
»»
E onde vigoram as mais amplas liberdades: liberdade de expressão; liberdade de
imprensa; liberdade de utilização de uma língua; liberdade de religião e de
culto; liberdade de consciência; liberdade de aprender e de ensinar; liberdade
de associação; liberdade de reunião; direitos políticos (eleger e ser eleito);
liberdade de circulação; direito à propriedade privada; liberdade de comerciar;
liberdade de contratar.
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(*)
Aristóteles mostrou um pensamento liberal (a melhor forma de governo é a
democracia representativa em que os eleitos o eram com base nas suas virtudes
pessoais) juntamente com pensamentos totalitários (os argumentos para a
existência da escravatura).
(**)
– Daqui os termos “artes liberais”, “profissionais liberais” – com o
significado de dignas de um homem livre.
A
primeira vez que o termo foi usado num contexto político foi em 1812 pelos
revolucionários espanhóis – Os Liberais –, rapidamente adoptado pelo Partido
Liberal Francês, e, em 1840, pelo Partido Liberal Inglês.
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Nota: os conceitos europeus são
diferentes dos conceitos utilizados nos Estados Unidos da América, onde a ideia
de liberalismo económico está associada a ideias neo-liberais e libertárias
(Partido Republicano) enquanto o liberalismo está associado a ideias
sociais-democráticas (Partido Democrático).
In Jornal de
Matosinhos nº 1741, de 2 de Maio de 2014
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