No programa Prós
e Contras do dia 19 de Maio de 2014, na RTP1, sobre o racismo, ouvi
claramente a opinião de muitos e variados opinadores, um dos quais, do
SOS-Racismo que declarou ser contra a recente inauguração, na cidade do Porto,
do Museu dos Descobrimentos, porque foi graças à Gesta dos Descobrimentos Portugueses
que a escravatura se abateu sobre os Povos Africanos, pelo que a inauguração do
museu será a apologia da escravatura.
Nada de mais
errado.
Um pouco de
História não faz mal.
Como nasceu,
então, a escravatura?
Ao certo
ninguém sabe.
Mas sabe-se
que os povos conquistadores escravizavam os povos vencidos, tivessem eles a
pele mais clara ou mais escura, olhos negros ou olhos azuis ou olhos em bico. “Ai
dos vencidos!”, disse Júlio César.
No império
romano, numa primeira fase, os devedores eram esquartejados e os despojos
distribuídos proporcionalmente pelos credores. Mas, porque o que os credores
queriam era os seus créditos, numa fase posterior, os devedores passaram a ser
vendidos como escravos e o produto da venda distribuído pelos credores. Fosse
quem fosse, o devedor era conduzido à condição de escravo.
O que
verdadeiramente houve, ao longo dos tempos, era a xenofobia – o medo, a aversão
ao que é estrangeiro. Nós somos os civilizados, os outros são “bárbaros”, são “a
barbárie”. Para os romanos, os gregos eram os bárbaros que, uma vez vencidos, pela sua cultura superior,
influenciaram a civilização romana.
Em Portugal,
numa primeira fase, não havia qualquer discriminação entre os povos de culturas
diferentes. Mais tarde, começaram por ser segregados em função da sua religião
– as mourarias e as judiarias – com mesteres que lhes estavam vedados.
Tudo fruto de
xenofobia – como se não conhece o “outro” dele se tem medo, aversão, antipatia.
Aquando da
Expansão Ultramarina, os povos encontrados, considerados “gentios”, eram
dominados, por vezes reduzidos à escravidão, mas não eram considerados seres inferiores
(*).
A
escravatura, com o advento da cultura da cana-de-açúcar e do tabaco, nas
Américas, era feita pelos negreiros que compravam os escravos em África a povos
negros que se dedicavam à captura de outros povos no sertão africano.
Mas os
grandes comerciantes de escravos não eram os europeus, mas os povos árabes,
aliás como ainda ocorre nos nossos dias.
O racismo
propriamente dito, com a classificação em povos superiores e povos inferiores,
teve a sua origem nos estudos científicos de Arthur de Gabineau, diplomata francês, autor do Ensaio sobre a Desigualdade Inter-racial Humana,
publicado em Paris, em 1853. Começou por dividir a Humanidade em raças, sendo a
raça superior a raça ariana, oriunda do Norte de França, que constituía a
aristocracia europeia.
Em 1899, Houston Stewart Chamberlain publicou Os Fundamentos do século XIX, em que
defendia a tese de que, afinal, os alemães é que eram os arianos, a classe
superior dos povos brancos. Na sua esteira, o ideólogo do partido Nacional
Socialista Alfredo Rosenberg
publicou, em 1930, a sua obra O Mito do
Século XX na qual evidenciou um total desconhecimento de antropologia, e
colocou na base da pirâmide das raças humanas os Negros e os Judeus.
O Racismo,
com a supremacia do chamado Homem Branco, nasceu com base em ideologias
pretensamente científicas, só nos finais do século XIX, não há tanto tempo
assim, portanto. Mas não obstante a total ausência de bases científicas,
encontra defensores um pouco por todo o lado.
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(*)
Gentio, no sentido de pagão (não cristão), que não é civilizado (à luz do
europeu da época).
Imaginem
o que pensariam os marinheiros de quinhentos vestidos com as suas roupas de lã,
encontrarem, nos trópicos, homens desprovidos de quaisquer vestimentas. Será
que eram culturalmente inferiores? A este propósito, convido o leitor a ler a Carta
do Achamento do Brasil, de Pero Vaz de Caminha.
In Jornal de
Matosinhos nº 1745, de 30 de Maio de 2014
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