Qualquer sistema informático de acesso público pode
conter uma maneira de se saber quem consultou um determinado ficheiro e quando.
E é assim que os bancos funcionam: quem consultar a sua ficha digital, depois
de, pelo menos digitar dois códigos secretos que são apenas do seu
conhecimento, sabe quando foi a última vez que a consultou. O dia e a hora. E se
mais alguém teve acesso a outra hora que não aquela em que o próprio acedeu,
deve avisar de imediato o banco.
É para isso que existem os filtros nos acessos aos
ficheiros digitais.
Também no Fisco deveria existir um sistema similar e não
existe, pelo que ninguém sabe se “alguém”, e quando, andou por lá a “cheirar”.
Para aceder aos nossos dados pessoais, para além do
número de contribuinte há um número secreto (quanto mais complexo melhor). Mas
a esse ficheiro informático têm acesso mais de dez mil pessoas, tantas quantas
são os funcionários da Administração Fiscal. Eles próprios também têm chaves de
acesso para acederem a toda a vastíssima informação constante dos ficheiros
digitais.
Actualmente, para além dos dados mínimos (se é ou não
casado e se o for com quem, a morada, os contactos telefónicos, os bens imóveis
e onde se localizam) consta muita informação valiosa: por onde anda o cidadão,
onde come, onde trata o cabelo, qual a sua oficina, a marca e o modelo da sua
viatura automóvel, onde se abastece de combustível, o centro comercial que
frequenta, os livros que lê, onde compra os jornais e que títulos, que roupas
veste, tudo fruto das facturas que os cidadãos pedem quando consomem e que são
remetidas, obrigatoriamente, pelo comerciante até ao dia 25 do mês seguinte.
Conhece-se, assim, o dia-a-dia de todo e qualquer
cidadão.
O cidadão comum, aquele de quem não se sabe da sua
existência – “Zé do boné”, o “Zé-dos-anzóis”, o “Zé da esquina” – não terá, em princípio,
quem deseje saber da sua vida.
Mas assim não será daqueles que são uma constante nas
revistas ditas sociais, das pessoas mais badaladas.
E como todos são iguais perante a Lei, todos deverão ter
os mesmos direitos.
Mas para se alcançar a verdadeira igualdade, o desigual
deve ser tratado desigualmente para se alcançar a igualdade material. E assim
se discriminam positivamente as mulheres, as crianças, os idosos, os deficientes.
E todos acham natural essa discriminação positiva.
Segundo notícias vindas a público, os serviços
informáticos da Administração Tributária estavam a estudar a possibilidade de
controlar o acesso à informação confidencial dos seus ficheiros. Para estudo
tinham apenas quatro cidadãos com um filtro especial, e por razões das suas
funções políticas: o Presidente da República, o Primeiro-Ministro, o
Vice-Primeiro-Ministro e o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
E logo se gritou “aqui d’el Rei”. Que não podia ser!
Gastaram-se rios de dinheiro em Comissões Parlamentares
de Inquérito, em audições de testemunhas. Muitas horas de trabalho perdidas. Demitiram-se
dois dirigentes da Administração Tributária. Todos duvidaram das suas palavras.
Que não havia lista nenhuma. Eram apenas estudos para se criar, se fosse
possível, um sistema de controlo de modo a que cada contribuinte tivesse
conhecimento de quem e quando vira as informações dos seus ficheiros digitais.
Dedicaram-se programas televisivos por causa de uma lista
que, afinal, não existe.
Nunca tantos se preocuparam tanto com o cumprimento de
normas constitucionais e legais, mas continua a praticar-se muita ilegalidade e
ninguém se preocupa.
Exemplos não faltam: circula-se de bicicleta nos passeios,
atravessa-se as passadeiras em cima das bicicletas, circula-se nas rotundas com
todo o à-vontade como se as normas de circulação não tivessem sido alteradas,
continua a cobrar-se o aluguer dos contadores de água, electricidade e do gás
(tipo consumo mínimo obrigatório), as acessibilidades na via pública, nos
transportes e aos edifícios onde funcionam prestadores de serviços, incluindo a
Função Pública, continua na mesma. Estaciona-se em cima dos jardins e nos
viadutos. Os ciclistas circulam em contramão. São proibidos os painéis
luminosos nas vias públicas que possam confundir, prejudicar a visibilidade e
perturbar a atenção dos automobilistas. Continuam a utilizar-se os telemóveis
enquanto se conduz. As Autoridades Administrativas continuam a agir como Juizes
de Direito, penhorando bens e vendendo-os por tuta-e-meia. As multas/coimas
são, muitas vezes, desproporcionais aos ilícitos cometidos.
Porquê?
Porque os incumpridores e os fiscalizadores são
transversais a todos os partidos políticos e isso não interessa para a luta
política!
O autor escreve de harmonia com o acordo
ortográfico de 1945.
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